quinta-feira, 8 de outubro de 2015
O Grande Desastre Aéreo de Ontem - Jorge de Lima - Deus seja louvado
O GRANDE DESASTRE AÉREO
Vejo sangue no ar, vejo o piloto que levava uma flor para a noiva, abraçado com a hélice. E o violonista, em que a morte acentuou a palidez, despenhar-se com sua cabeleira negra e seu estradivários. Há mãos e pernas da dançarina arremessadas na explosão. corpos irreconhecíveis identificados pelo Grande Reconhecedor. Vejo sangue no ar, vejo chuva de sangue caindo nas nuvens batizadas pelo sangue dos poetas mártires. Vejo a nadadora belíssima, no seu último salto de banhista, mais rápida porque vem sem vida. Vejo três meninas caindo, rápidas, enfunadas, como se dançassem ainda. E vejo a louca abraçada ao ramalhete de rosas que ela pensou ser o paraquedas e a prima-dona com a longa cauda de lantejoulas riscando o céu como um cometa. E o sino que ia para a capela do oeste vir dobrando finados para os mortos. Presumo que a moça adormecida na cabine ainda venha dormindo, tão tranquila e cega! Ó amigos, o paralítico vem com extrema rapidez, vem como uma estrela cadente, vem com as pernas do vento. Chove sangue sobre as nuvens de Deus. E há poetas míopes que pesam que é o arrebol!
Jorge de Lima
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